segunda-feira, 30 de abril de 2012

Poetizando a existência:


PERENE RISCO DE SER

“Dum loquimur, fugerit invida aetas: Carpe diem quam minimam credula postero”. Horácio.


José Aristides da Silva Gamito


Viver e existir são quase sinônimos!
Existir é o perene risco de quem vive,
Às vezes, dá medo a gente existir.
Há fases como tudo na vida!
Há vezes que gostaria de existir
Aos bocados, saltitando, pulando pesadelos,
Como um animal ágil e sorrateiro.
Mas não tem como não apostar.
Para poder se alegrar
É preciso estar vivo
Correndo o risco também da dor!

A existência se mostra medonha,
Cheia de mistérios e de riscos,
Fenômenos sem sentido acontecem,
Tem gente que vive explicando tudo,
Vive fugindo desesperada do inefável.
Tudo inútil! Viver dói mesmo.
Às vezes, suspendo meu existir
Por instantes para perceber como é
Não-ser, mas é só pra testar!

A graça e a tragédia sempre se aliarão,
Não existe vida sem alternância
Entre essas duas dimensões.
Insisto em continuar a ser mesmo
Em face à possibilidade da dor.
Porque existir sempre será
O perene risco de quem vive!

Conceição de Ipanema, madrugada de 30 de abril de 2012

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Diálogos sobre o Cristianismo:


O QUE FIZERAM DO LEGADO DE MARTINHO LUTERO?

José Aristides da Silva Gamito*

Nos últimos dias, conversando com alguns evangélicos eu percebi o quanto que umas vertentes do evangelismo se distanciaram da Reforma Protestante do Século XVI. O esforço e o ideal de Martinho Lutero foram traídos por muitas igrejas. Refiro-me principalmente ao movimento neopentecostal. A doutrina da Sola Scriptura transformou-se na Sola voluntas mea. A interpretação individual da Bíblia se tornou regra de fé e as impressões dos fiéis se tornaram revelações divinas. Muitos se comportam como intérpretes da vontade divina e abusam do texto bíblico com uma interpretação literal e radical.
A Reforma Protestante apareceu na história do cristianismo como uma oportunidade ímpar de reabastecimento, de revisão. As reações foram muito institucionalizadas e o ideal do cristianismo foi pouco considerado. Em pouco tempo, vimos os ideais da Reforma serem ignorados. Muitos se aproveitaram da liberdade religiosa para criarem um cristianismo a seu modo.
É estranho constatar que novas igrejas têm comportamentos medievais. Muitos fiéis tendem ao fanatismo, à ideia de um Deus vingador e à tentativa de implantar uma teocracia na política brasileira. O neopentecostalismo se sustenta sobre ideias radicais e resgata, de certa forma, um cristianismo medieval. Essas tendências podem percebidas em Igrejas Neopentecostais assim como na Igreja Católica. No catolicismo, a Renovação Carismática representa esta tendência.
Este retrocesso soa negativo para o evangelismo em relação a Lutero. O combate de Lutero ao catolicismo medieval parece não mais servir de referência para muitos evangélicos. Retrocesso parecido acontece na Igreja Católica indo de contramão à reforma do Concílio Vaticano II. É assustador em nossos tempos perceber tal retrocesso nas Igrejas Cristãs. O fundamentalismo religioso é um grande mal em uma sociedade, além de ser contrário ao espírito do Evangelho, por conter em si uma violência ideológica!


*Bacharel e licenciado em filosofia e especialista em Docência do Ensino Básico e do Superior.

domingo, 15 de abril de 2012

Crítica sobre o Cristianismo:


CRÍTICA SOBRE AS ABORDAGENS COMUNS DA LITERATURA BÍBLICA

José Aristides da Silva Gamito*

Neste artigo, proponho-me a discorrer sobre um assunto muito delicado para muita gente: Os limites do texto bíblico e os perigos das interpretações. Já passamos por fases mais racionais sobre a abordagem do texto bíblico, mas hoje crescem constantemente movimentos fundamentalistas cristãos. Eu fui educado como católico, mas atualmente tenho outra visão da Bíblia. As abordagens mais comuns da Bíblia pecam por parcialidade. Não é possível uma objetividade literária, mas precisamos nos distanciar um pouco do texto para deixá-lo respirar. Vamos lá!


1.        Introdução

A fragmentação do cristianismo procede de vários fatores de divergências entre os cristãos, o principal deles parece ser a interpretação do texto bíblico. A Bíblia não é um livro de fácil interpretação. Primeiramente, não é um livro só! É uma coleção de livros de autores, gêneros, objetivos e épocas diferentes. Não existe uma unidade literária. A unidade que as pessoas enxergam é dogmática.  A autenticidade destes textos é assegurada por dogmas como inspiração, inerrância, revelação. Tudo isso é historicamente difícil de ser resolvido. Encarcerar Deus em um livro pode ser muito perigoso! Portanto, é preciso uma crítica cuidadosa e rigorosa para abordar o texto bíblico.
A Bíblia é o livro mais manipulado da história. Ele é refém de muitas igrejas e movimentos. Como pode ser isso? Os católicos, ortodoxos e evangélicos consideram todo o conjunto dos livros como palavra de Deus a todo custo. Os ateus desconsideram tudo o que se diz na Bíblia. São abordagens radicais! Ninguém nascido na civilização ocidental, certamente, não conseguirá ter uma leitura imparcial da Bíblia.
As igrejas “históricas”[1] possuem uma crítica textual e uma teologia bíblica que consideram as limitações do texto, admitem o uso da racionalidade sobre ele. Mas isso não é suficiente! Há muitos assuntos que não são possíveis de serem resolvidos pela Bíblia. As igrejas que consideram a tradição recorrem a ela. Mas permanece um problema: Como interpretar a vontade de Deus para assuntos modernos e não tratados pela Bíblia? Neste caso, resta apenas a ética secular para pensar possíveis respostas.
A filosofia foi escrava da teologia para resolver o problema da falta de sistematização da Bíblia e também da resolução de problemas dogmáticos e morais não tratados pela Bíblia. A interpretação da Bíblia não é simples! Simplificar este problema é índice de irresponsabilidade.

2.    Atributos fundamentais da Bíblia

Antes de qualquer abordagem do texto bíblico devemos considerar alguns atributos  fundamentais: a) Antiguidade. b) Pluralidade. c) Descontinuidade. c) Ausência de intencionalidade sistemática. c) Desprovimento de dogmas. Vejamos essas características por parte. Todos esses atributos demonstram o nível de precaução que devemos ter antes de dogmatizar, de decidir uma interpretação bíblica.

2.1.            Antiguidade
O texto bíblico é antigo. Isso quer dizer que foi escrito em época, tempo e cultura diferente da nossa. A língua, os costumes e a moral são outros. Não dá para aplicar literalmente todas as recomendações bíblicas aos costumes modernos. O leitor precisa de muitos conhecimentos interdisciplinares para dar qualquer interpretação conclusiva sobre a Bíblia. Além disso, a transmissão textual, as traduções, as diferentes “contaminações” do texto limitam uma interpretação segura. Portanto, não é fácil ler e entender a Bíblia.

2.2.            Pluralidade
            O texto bíblico é plural do ponto de vista das épocas, lugares, autores e objetivos. Cada texto pertence a diferentes contextos. E o texto possui ideias, interesses, intenções e formas diferentes. Não existe uma continuidade na Bíblia. A forma como conhecemos a Bíblia como um livro único é algo bastante moderno. As edições foram desenvolvidas pelos monges medievais, mas formatadas de modo mais definitivo a partir de Gutenberg.  Os cânones são antigos, mas a consolidação desta visão de unicidade é recente e controversa, já que o cânone definido nos primeiros séculos foi contestado no século 16.


2.3.            Descontinuidade
            O texto bíblico é descontínuo. O Antigo Testamento é judaico. O Novo Testamento é cristão. A busca de unidade entre os dois testamentos e entre os livros entre si não é simples. Há descontinuidade de temas, de propósitos. Há repetições, contradições. Não é fácil harmonizar esta pluralidade de textos. O conceito de Deus, a moral, a religião institucional, tudo muda durante a leitura sequencial dos livros.

2.4.  Ausência de intencionalidade sistemática
            Não se pode deter da simples leitura do texto bíblico uma intencionalidade sistemática de todos os dogmas que sustentam o cristianismo. Este processo foi desenvolvido no período pós-bíblico, depois da consolidação do cristianismo. Qualquer tentativa de ver evidência desta intencionalidade já é fruto do dogmatismo sustentado pelas igrejas.

2.5.  Desprovimento de dogmas
            O texto possui mandamentos, decretos, leis, sermões, mas não existem continuidade, sistematização e unicidade. As recomendações variam de acordo com as épocas. Não existem dogmas objetivamente redigidos na Bíblia. São experiências e declarações de fé. As recomendações não são universais, formais e absolutas. A Bíblia é o resultado de diferentes experiências de fé, não é um tratado dogmático e moral.

3.        Considerações finais

A discussão é muito mais do que foi apresentado neste texto. O propósito do texto foi mostrar algumas limitações históricas do texto bíblico.  Não basta simplesmente citar versículos e achar que já provou ou resolveu uma questão. Não dá para ignorar a experiência dos teólogos que nos precederam, do esforço de tantas igrejas em épocas diferentes. Ignorar a história é fundamentalismo!
A Bíblia precisa ser considerada historicamente, podemos mais ou menos vislumbrá-la, porém nenhuma interpretação pode ser absoluta. A postura cristã maximiza sua importância. A postura ateísta minimiza sua importância. Não podemos negar a importância da leitura bíblica para entender a civilização ocidental. Enfim, as diversas abordagens do texto bíblico estão “contaminadas”, “viciadas” por fundamentalismos. Mas será que um dia poderemos enxergá-las como foram pensadas por seus diversos autores?


[1] O termo refere-se às igrejas que admitiram à racionalização da teologia como a Igreja Católica e as protestantes.

sábado, 14 de abril de 2012

Ética e relativismo


A IRREDUTIBILIDADE DO IMPERATIVO DOGMÁTICO “NÃO MATARÁS”

José Aristides da Silva Gamito*

Diante da notícia da autorização legal de abortar anencéfalos, retomo neste artigo uma discussão que travei com colegas nos tempos da minha graduação em filosofia. O assunto é justamente a distinção entre valores relativos e valores absolutos na ética. Apesar da tendência de universalidade, a ética sofre influência da historicidade. Muitos costumes, comportamentos e valores mudam com o tempo. Mas se chegarmos a relativizar tudo, o que realmente poderia ser afirmado como valor absoluto e irredutível na ética?
As pessoas de fé costumam afirmar “se Deus não existe, tudo é permitido”. A afirmação parte da tendência de sustentar os princípios morais na vontade de Deus. É uma forma de absolutização ética que não consideramos legítima. A ética é historicamente construída, não é revelada. A sua gênese parece se encontrar nos mecanismos de socialização. Seus princípios visam possibilitar a humanização do animal. Humanização esta que se dá na vida em sociedade. O homem, “animal político”, adota para a sua coexistência com os outros princípios orientadores que possibilitam a convivência entre as diferentes liberdades.
Em hipótese, uma pessoa poderia ignorar todas as regras, relativizar todos os valores. A sua liberdade permite. Porém, esta redução se esbarra em um limite que o imperativo dogmático “Não matarás” impõe. A morte é a negação de toda possibilidade de diálogo, é a desumanização do homem. É um princípio absoluto e proposto dogmaticamente na ética, por ser seu princípio fundador. Então, permitir a vida é o ponto de partida e de possibilidade de diálogo e construção de qualquer sistema ético.
Por isso, toda lei, todo valor, qualquer normatização pode se transformar com o tempo, menos os imperativos que regem o direito de viver. E o “Não matarás” possui muitos desdobramentos, inclusive, a proibição de não causar dor a outrem. A dor covardemente provocada é um ensaio para o homicídio. Este imperativo moral perpassa praticamente todos os sistemas morais e religiões do mundo.
Neste ponto, trazemos à discussão o pensamento do filósofo Emmanuel Lévinas. Segundo ele a referência ética não pode ser o eu, mas o outro. Antes de eu entrar em diálogo sobre qualquer valor ou ação no mundo preciso considerar a existência do outro, pois, eu sem o outro não sou alguém. Nenhuma pessoa poderia viver sozinha, afirmando de um modo absoluto e radical. Lévinas chega a afirmar que o rosto do outro traz uma ordem “Tu não matarás”.
Portanto, podemos relativizar e transformar valores, mas existe um limite que é o imperativo dogmático moral que proíbe matar. O assassinato é um ato de covardia, de negação do fundamento do diálogo, da proposição de valores e regras de convivência. Ninguém pode decidir pela morte do outro. O aborto é um dessas ações que ferem o fundamento da ética. Nem tudo é relativo, pois se assim fosse até mesmo a afirmação de que tudo é relativo seria um pressuposto relativo.

*Bacharel e licenciado em Filosofia e especialista em Docência do Ensino Básico e do Superior.

Ética e controvérsias sobre a vida:


ÉTICA E DIREITO DOS ANENCÉFALOS: QUEM NÃO TEM CÉREBRO NÃO TEM DIREITO À VIDA?

José Aristides da Silva Gamito*


A decisão do Supremo Tribunal Federal a favor do aborto dos anencéfalos é muito ousada e polêmica.  As implicações éticas e sociais desta autorização legal de uma forma específica de aborto são enormes. Os ministros tomaram uma decisão sem preparar e informar melhor a população brasileira sobre o que seria votado. Uma porcentagem elevada da sociedade não sabe exatamente o que é anencefalia. É um assunto técnico e bem complexo.
O Brasil é um país de um forte sentimento religioso, por isso, jamais poderia deixar a população, principalmente, as entidades religiosas fora da discussão. O Estado laico não pode tomar suas decisões baseadas em preceitos religiosos, mas também não  pode ignorar as referências éticas de um povo. No momento da discussão muitas entidades religiosas não conseguem estabelecer um diálogo eficaz com o Estado sobre o assunto por causa da referência à fé. Quando se vai discutir com a pluralidade de ideias é preciso ter um princípio mais comum.
Em matérias muito delicadas como esta é preciso um tempo de informação, de amadurecimento. Além disso, o Supremo assumiu o papel do Legislativo. Se o Código Penal considera o aborto como crime, qualquer outra exceção além das previstas pela legislação teria que ser tratada pelo legislativo.
Outra questão fundamental é o direito das mulheres. Ainda não discutimos suficientemente os limites entre o direito da gestante e o do feto. Se abortar em situações comuns é crime porque o feto é vida, é ser humano, como podemos pensar que só porque alguém não tem cérebro não tem direito de viver? Portanto, esta distinção enquanto indivíduo/ser humano entre gestante e feto precisa ser melhor discutida.  Respeitar cada vez mais a dignidade da mulher é algo positivo, mas é preciso refletir com cautela sobre assuntos que envolvem a vida.
Creio que o direito à vida é de quem está vivo e não de quem tenha ou não cérebro total ou parcial, ou em graus variáveis. Enquanto houver vida independente da presença ou ausência de cérebro viver é um direito tácito e natural. Portanto, por estes e outros motivos podemos afirmar que a decisão do Supremo foi precipitada, não era o momento certo, faltou amadurecimento ético.

*Bacharel e licenciado em Filosofia e especialista em Docência do Ensino Básico e do Superior.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Mais um aniversário:

O TEMPO PASSA E O QUE A GENTE FAZ?

“Doce me esse iustus, Domine”

Acompanhe-me nas redes sociais. Leia meus artigos.
Hoje eu resolvi comentar um assunto pessoal. Eu fiz aniversário recentemente! Quero refletir sobre a fugacidade do tempo e o que a gente faz de útil no tempo que passa. Eu sempre tive um propósito de viver bem, de ter um ideal, um rumo a seguir. Isso é bom! Quem não tem boas intenções nem para si como pode pensar nos outros?!  Mas a rotina carrega todo mundo.
Todo ser humano tem de construir um propósito para sua vida. Quando nascemos nossos pais já determinam alguns direcionamentos para a nossa vida, mas somos nós que construímos o sentido para onde queremos chegar. Segundo Sócrates “uma vida não examinada não merece ser vivida”. Por mais que a gente aja sem planejamentos, de modo inconsciente, mas boa parte de nossas ações para serem bem sucedidas, elas dependem de reflexão e propósito.
Na verdade, a discussão sobre o sentido da vida se esbarra no clássico problema da felicidade. O maior desafio para as pessoas que são ansiosas pela felicidade instantânea é a imprevisibilidade da vida. Não é possível planejar totalmente nossas ações. Somos alvos do cruzamento de várias ações. Nem tudo é subjetivo!
Portanto, cabe a nós mudar o que pode ser mudado e aceitar o que não pode ser mudado. Isso não quer dizer comodismo! Mesmo aceitando o que não pode ser mudado, nós o fazemos de maneira singular, própria, pessoal. Ninguém fará igual. Muitas pessoas procuram o sentido absoluto e linear para as suas vidas, mas isso não é possível, tudo é devir.
O tempo é o nosso parâmetro. Todo dia precisamos nos renovar. Devemos ser resistentes ao mal! Errar somente quando não depender de nossa consciência e da nossa vontade. Ninguém nunca vai conseguir ser tudo o que quer, mas pode ser um pouco do que propôs para si a fim de que seja justo. Eu sempre mantenho o propósito de ser sempre melhor. Errar, erramos. Mas nunca devemos perder o rumo do nosso propósito de acertar!




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quinta-feira, 5 de abril de 2012

Capitalismo e o mito de Midas:


TUDO QUE O CAPITALISMO TOCA SE TRANSFORMA EM OURO

José Aristides da Silva Gamito*

O mito de Midas é uma boa metáfora para falar do poder transformador do capitalismo. O mito conta que certa vez o deus Baco quis retribuir um favor ao rei Midas e deu a este a oportunidade de realizar um pedido. O rei pediu que tivesse poder de transformar em ouro tudo que tocasse. A princípio, Midas ficou fascinado. Mas de repente começou a perceber os males do seu poder. Ele não conseguia mais nem comer e nem beber. Até sua filha se transformou em estátua de ouro. A comida, a bebida, as pessoas, tudo se transformava em ouro quando ele as tocava, por fim, o rei começou a correr risco de morrer de fome. Então, pediu a Baco para desfazer o dom.
Assim, acontece com o capitalismo. É intrigante o poder que este sistema econômico tem de transformar tudo em bem comerciável. Na época da Páscoa assim como a do Natal, percebemos como o mercado comercializa as festas, as manifestações culturais e os valores inerentes a esses costumes.  O consumismo supera a solidariedade e o espírito de fraternidade.
Na história da humanidade nunca antes se imaginou o enriquecimento com atividades como o entretenimento, a produção de ideias. O corpo se tornou fonte de riqueza. A indústria pornográfica é prova disso. E tantas outras profissões e costumes que se tornaram bens lucrativos. Mas os efeitos colaterais são semelhantes aos do mito de Midas. O ser humano comercializou e explorou tanto os recursos naturais que corre risco de ser extinto. Portanto, transformar tudo em ouro é uma atitude irracional.
É lamentável ver como as pessoas sentem necessidade de consumir simplesmente porque é Páscoa. O chocolate, por exemplo, é item obrigatório. As propagandas obrigam as pessoas a sentirem vontade de consumi-lo. Mas os valores propostos para essas datas comemorativas simplesmente desaparecem por trás de tanta comercialização. Acredito que é tempo de a gente recuperar a autonomia e reinventar esses espaços na nossa cultura, atribuindo-lhes seus valores originais.

*Bacharel e licenciado em Filosofia e especialista em Docência do Ensino Básico e do Superior.

Comentário sobre os tempos da Quaresma e da Páscoa:

UMA ABORDAGEM EXISTENCIALISTA DA TRANSIÇÃO ENTRE QUARESMA E PÁSCOA 

José Aristides da Silva Gamito*

A ritualidade do tempo da Quaresma assim como da Páscoa pode soar estranho para a sociedade contemporânea. Vivemos em um tempo marcado pela busca do prazer intenso e pela felicidade instantânea. Não suportamos esperar dez minutos em uma fila de banco. No trânsito, a impaciência é total. Fugimos constantemente do sofrimento e camuflamos a morte.
O espírito do cristianismo produz justamente dois antídotos para os males da contemporaneidade: A penitência e a renovação. A vida é um processo fugaz. Tudo se transforma rápido e muitas vezes acumulamos manias e defeitos sem tempo para realizar uma catarse. Há necessidade da disciplina, da auto-avaliação, da proposta de mudança. Essas propostas estão presentes na ritualidade da Quaresma e se completam com o evento da Páscoa. As pessoas vivem um processo de ressignificação de suas ações.
Nem sempre conseguimos realizar esses processos sozinhos. É preciso que alguém proponha, vê-se neste ponto a necessidade de uma comunidade que compartilha da mesma proposta. No caso da Páscoa, o cristianismo perdeu muito com a comercialização da data pela mídia. Mas o evento em si é uma proposta de renascimento expressa através de uma densa simbologia: A ressurreição.
Portanto, a mensagem destes dois tempos é contraditória para a modernidade; por isso, serve de antídoto. É um convite à desaceleração, à ascese, à auto-restauração. Todo mundo precisa deste tempo de auto-avaliação e recomeço. Sem isso nós nos perdemos na rotina e nos distanciamos daquilo que queremos ser: Pessoas melhores.
Não tem como fugir da disciplina se quisermos nos aperfeiçoar como pessoas humanas temos de ter a humildade e admitir nossos erros. E corrigi-los é uma tarefa árdua. Só assim daremos passos significativos rumo a uma vida melhor.

*Bacharel e licenciado em Filosofia e especialista em Docência do Ensino Básico e do Superior. 


Publicado em: www.portalecclesia.com