HOMO
HÓMINI LUPUS: QUESTÕES DE SEGURANÇA NO BRASIL
José Aristides da Silva Gamito
A
precariedade da segurança no Brasil suscita uma solução por parte de uma
parcela da população que é digna de análise ética. Há propostas veiculadas
pelas redes sociais que formam um discurso que pode ser apresentado sob os
seguintes princípios: A desvalorização dos direitos humanos, a execução sumária
de bandidos (“bandido bom é bandido morto”), a usurpação da competência do
policial e do judiciário (“justiça com as próprias mãos”). É um discurso que
admite quase nenhuma racionalidade!
Todos
esses discursos apelam para a indignação de um cidadão que foi assaltado,
agredido. Quando passamos por situação semelhante, isso aumenta nossa raiva e
indignação contra os criminosos. Porém, o discurso apresentado como solução
para esses problemas de falta de segurança, geralmente, são pautados no
princípio de violência como resposta à violência.
Primeiro,
os defensores dessas ideias ignoram toda a trajetória de conquista dos direitos
humanos e reduzem a atuação de alguns organismos a “proteger bandidos”. Se há
falhas na atuação de órgãos de direitos humanos no país, isso tem de ser
corrigido. Outra coisa, não se pode confundir um órgão com os valores e os
princípios que denominamos de direitos humanos. Assim se induz a uma regressão
histórica da ética!
A
execução sumária de bandidos conduz a sociedade a um estado de barbárie
generalizada, ao estado imaginado por Thomas Hobbes no qual “o homem é lobo do
homem” (homo hómini lupus). A partir deste princípio, cidadãos comuns
usurpam da competência do policial e do judiciário. Os cidadãos identificam o
crime, julgam, sentenciam e executam o suposto criminoso sem direito de defesa.
Nesse cenário, deixamos de enxergar pessoas, vemos paranoicamente indivíduos que
podem cometer crimes! Na verdade, o Estado fica invalidado e vence na disputa o
mais forte. E com esta grosseira atitude de punir criminosos na rua, fazendo “justiça
com as próprias mãos”, cidadãos cometem erros absurdos agredindo pessoas
inocentes por causa de meros boatos de culpabilidade!
Como
resposta a uma sociedade dominada pela violência, não podemos retornar à lei do
talião. Se a autoridade política suprime o papel do Estado, que já está
enfraquecido no quesito segurança, e arma a população autorizando-a a eliminar bandidos,
no fundo, um caos generalizado está sendo autorizado. É um mandamento perverso “Matem-se
uns aos outros. Quem for mais rápido vencerá!” No fundo, esses discursos sendo
assumido por autoridades políticas como o deputado Jair Bolsonaro isso representa
a admissão do fracasso do Estado. O armamento da população é, no fundo, assumir
que somos uma sociedade violenta, na qual até “homens de bem” matam! “Justiça
com as próprias mãos” não é justiça, é vingança generalizada!
Outra
situação preocupante é a adoção desse discurso taliônico por grupos cristãos. Enquanto,
o núcleo moral do cristianismo dos Evangelhos comporta um discurso de
não-violência, de compaixão e perdão aos inimigos, alguns cristãos assumem
desveladamente uma posição contrária sem perceberem a contradição. Este é o “cristianismo
apesar de Cristo”. Vivemos
em um país cristão no qual 75% da população concordam que “bandido bom é bandido morto”!
No
fundo o que precisamos é de leis que sejam cumpridas, de segurança eficiente e
de justiça que coloquem freios na bandidagem e não nos tornarmos “bandidos
legitimados”. Passamos a desacreditar na
força do bem e da justiça e ficamos desesperados por causa da banalidade do mal
e nos entregamos a ele com única solução!