“A
DOR DA SAUDADE QUEM É QUE NÃO TEM”
O olhar do Jeca nos lembra essa tristeza impressa na música caipira. |
Comumente se diz que só a língua
portuguesa tem uma palavra para nomear o sentimento da saudade. A afirmação é
parcialmente verdadeira. Das muitas línguas que conheço todas têm palavras para
designar este sentimento, mas o português tem uma relação específica com este
sentimento.
Lendo recentemente um artigo no site
da BBC intitulado The European country
that loves being sad (O país europeu que ama ser triste)[1] fui
remetido a essa especificidade do espírito português presente na nossa língua.
Eric Weiner, autor do artigo, comenta que enquanto o americano tem uma
necessidade de buscar a felicidade ou ser feliz a todo custo, o povo de
Portugal já é diferente. Segundo ele, quando se pergunta a uma pessoa
portuguesa como ela está, a resposta mais entusiasta que se pode receber é “mais
ou menos”.
De acordo com o autor, Portugal tem uma
cultura de melancolia difícil de perder. Enquanto em alguns países homenageiam-se
com estátuas generais, naquele país fazem-se esculturas para os poetas. Weiner
lembra a especificidade da palavra saudade. Uma palavra intraduzível para
outras línguas. Ele a define como uma dor por alguém ou por algum lugar que um
dia nos deu grande prazer. Difere-se de nostalgia por causa do senso de
ausência e de perda.
Isso está fortemente expresso pela
música. O fado, principal ritmo português, demonstra essa tristeza. A sua
origem está ligada a prostitutas e a mulheres de pescadores que conviviam a
possibilidade constante de seus maridos não voltarem do mar. Portanto, surge no
meio de pessoas que lidavam com o sofrimento.
Não poderíamos encontrar resquício
desse espírito na música brasileira? A música caipira tem um acento forte nas
paixões mal sucedidas e no sofrimento da vida no campo. Um clássico como “Saudades
de Matão” de Jorge Galati exemplifica isso. Assim seguem as músicas de fossa
para afogar as mágoas, exemplo típico dos anos 70 é a cantora Maysa.[2]
Nos anos 80, o sertanejo romântico de Zezé di Camargo e Luciano e de Leandro e
Leonardo resgata o tema do amor dolorido e atualmente, temos a ‘sofrência’.
Tudo inspira tristeza.
A alegria na nossa música parece
entrar com a herança africana, principalmente, a partir do samba e do Carnaval.
Atualmente, temos uma diversidade de espíritos predominando na nossa música,
principalmente, a tendência hedonista do sertanejo universitário, do funk.
Neste caso, música não foi feita para cantar tristeza, mas para estimular a
festa, ao sexo, a bebedeira. Mas, à moda de Portugal, nossa música nunca deixou
de cantar a tristeza, porque, como diz a canção de Amácio Mazzaropi “A dor da
saudade quem é que não tem”.
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