SER E TER, QUERER E PODER: OS VERBOS FUNDAMENTAIS
DA AÇÃO HUMANA
José Aristides da Silva Gamito*
Em filosofia, muito se discute sobre os valores morais e os limites da liberdade humana. Todas as nossas atitudes cotidianas estão carregadas de juízos de valor. Nós selecionamos o que é bom, o que é mau. E, consequentemente, realizar boas escolhas e usar a liberdade com responsabilidade são condições importantes para que vivamos em sociedade, garantindo a paz e o bem-estar de todos.
Existem quatro verbos fundamentais que nos ajudam a avaliar a ação moral: Ser e ter, querer e poder. O ser refere-se à nossa identidade, como nós nos definimos e nos situamos no mundo, principalmente, em relação aos outros. O senso moral requer que a gente saiba se situar no mundo, se impor. A ética de Aristóteles afirma que precisamos estar atentos aos excessos. O ideal é ser na medida certa. Há pessoas que se perdem no “parecer ser”. Elas ostentam uma imagem, apegam-se a uma máscara e querem ser o que não são. Existem também aquelas que são menos, ou seja, se reprimem e se consideram inferiores às outras pessoas.
O ser tem uma relação muito direta com o ter. A sociedade consumista valoriza demais o ter. Porque este ajuda a manter as aparências. Nós precisamos ter bens para a sobrevivência e para garantir a qualidade de vida, mas quando temos em quantidade demasiada, acumulamos, desprezamos o ser dos outros. Muitas pessoas têm de sobra enquanto outras são privadas de bens indispensáveis à vida. Assim como o ser, o ter precisa ser dosado. Ter acima do ser desumaniza as relações.
O outro par importante é querer e poder. Consideramos poder no sentido de ser permitido, ter capacidade para realizar uma ação. A avaliação ética depende de uma pergunta fundamental: “O que eu quero, eu posso?” Há pessoas que perdem a noção de limite e pensam que podem realizar tudo que querem. E neste sentido, querer não é poder. Todos nós temos direito de defender qualquer ideia, crença, mas antes de pô-las em prática temos de avaliar os valores éticos da sociedade na qual estamos inseridos, principalmente, as consequências de nossas ações na vida dos outros. Jamais podemos nos esquecer disso: Eu decido por mim, mas nunca pelos outros. A decisão é uma atitude singular.
Na difícil tarefa da busca pela felicidade é importante avaliarmos nossas ações, nos questionando: “Quem sou”, “o que tenho”, “o que quero” e “o que posso”. A pessoa nunca deve se esquecer, em suas atitudes quotidianas, de que é um ser humano, de que deve ter o necessário para viver dignamente e não se perder no excesso que priva o direito do outro; não se esquecer de considerar que a vontade nem sempre coincide com aquilo que pode ser feito.
Em síntese, a liberdade não é ilimitada. Hoje, vemos nos noticiários muitos jovens que se perdem no crime. E muitos deles são jovens de classe média. Parece que a atual geração de pais não aprendeu a dizer “não” aos seus filhos, a ensinar-lhes que nem tudo que querem, podem.
Portanto, a ação moral depende da harmonia entre aquilo que somos, que temos, que queremos e que podemos. A felicidade, a vida em sociedade, todas dependem de um bom juízo moral. Evitando os excessos, como já ensinava Aristóteles. E nunca perder de vista a pessoa do outro porque é na alteridade que eu me humanizo, que eu me descubro gente: “Homem algum é uma ilha”.
*Bacharel em Filosofia e especialista em Docência do Ensino Básico e Superior.