quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Crítica e Cristianismo

O EVANGELHO DA TERRA E DA COMPAIXÃO


Ao longo da história, identificamos um cristianismo muito legalista e carrancudo, justamente tudo ao contrário do que percebemos no Jesus dos Evangelhos. Muitas igrejas continuaram o Deus do Antigo Testamento. Creio que elas pensam que ele é mais prático, soluciona mais os problemas advindos da vaidade humana. Mas, vamos ser francos. O deus do Antigo Testamento é um deus tribal, troglodita, rude e vingativo. Jesus revela o rosto de um deus mais ameno, paciente e compassivo. Porém, pelo que a gente percebe muita gente não gosta disso. Há gente que prefere um deus arma, pronto para disparar contra os inimigos. É um deus à imagem e semelhança do homem.
Nos Evangelhos, percebemos dois aspectos essenciais da mensagem de Jesus: Terra e Compaixão. Primeiro, se encararmos o famoso Sermão da Montanha (Mt 5), perceberemos o foco de Jesus em torno de problemas humanos e da justiça sociais. Percebemos ali quem herdará a terra e que são justificados aqueles que têm sede e fome de justiça e aqueles que promovem a paz. A partir do versículo 38, Jesus fala sobre um amor incondicional, sobre uma relação desinteressada e chega a afirmar a necessidade de ‘amar os inimigos’.
A compaixão predomina no discurso de Jesus em seus diversos encontros com pessoas excluídas pela sociedade da época: Os leprosos, a mulher adúltera, a samaritana. O ápice é o perdão que ele concede aos seus malfeitores. Portanto, ser compassivo é constitutivo da personalidade e da mensagem de Jesus.

Em Mateus 25, 31-46, existe uma narrativa que parece a conclusão da pregação de Jesus. Em seu juízo final, as pessoas condenadas são aquelas que negaram direitos fundamentais do ser humano como o direito a comer e a beber, à hospedagem, à liberdade. Portanto, o Evangelho se refere a uma boa notícia para a Terra e para que nela aconteçam os direitos das pessoas e elas se amem mutuamente. Portanto, toda Igreja que se prenda a focos particulares, elitistas, egoístas e mesquinhos não representam o Jesus dos Evangelhos.

domingo, 9 de novembro de 2014

Reflexões sobre ateísmo

ATEOFOBIA. O QUE É ISSO?



Sou de família de tradição católica, tenho formação teológica, mas minha perspectiva religiosa é agnóstica. Não posso deixar de refletir sobre um tema muito importante e em alta na sociedade contemporânea: Ter ou não ter fé. Em tempos atrás, muitos católicos de boa índole faziam o sinal da cruz quando se pronunciava a palavra 'ateu'. Ou seja, ateu era sinônimo de diabo. Sempre as grandes religiões, mesmo nos momentos históricos de maiores imoralidades, insistiram em menosprezar os ateus. E muito mais, condená-los ao inferno, considerando a crença superior à descrença.
Mantenho-me sempre em diálogo com crentes e não-crentes. Mas é uma tarefa muito difícil convencer uma pessoa muito religiosa a respeitar um ateu ou um agnóstico. No meio religioso reina a ditadura da crença, paradoxalmente dentre aqueles que defendem a democracia.
Aceitar ou não a condição religiosa ou não-religiosa do outro é uma questão de ética. O sentido da vida não é dado e nem revelado sobrenaturalmente. Ele é construído pelo homem dentro do espaço e do tempo. Com isso queremos dizer que as religiões são históricas. Portanto, cada pessoa tem uma experiência de vida. Circunstâncias diferentes levam pessoas a caminhos diferentes. Além dessa herança, existe o poder de decisão, de crer ou não crer.
Com a expressão "sem Deus não somos nada" as pessoas de fé consideram e apresentam todas as razões possíveis de que não crer é terrível, como se fosse impossível um ateu ser bom, feliz e bem realizado. O sentido da vida está muito além da crença e cada pessoa ou grupo desenvolve suas razões para estar no mundo.
O que o crente não percebe é que tanto pessoas de fé quanto ateus são felizes e são infelizes. Depende da vida de cada um e a moralidade é um atributo da razão. Todo homem é racional e está ao seu alcance construir o sentido da vida e optar pelo bem independente de ter fé.
Quando pessoas perdem oportunidade de construir uma boa amizade para discutir preferências sobre fé, eu me lembro da aposta de Pascal: "Se você acredita em Deus e estiver certo, você terá um ganho infinito; se você acredita em Deus e estiver errado, você terá uma perda finita; se você não acredita em Deus e estiver certo, você terá um ganho finito; se você não acredita em Deus e estiver errado, você terá uma perda infinita." Apesar de discordar da insinuação dessa aposta pacaliana, usei o texto para ilustrar que a fé é uma aposta no presente em algo que só pode ser provado no futuro totalmente desconhecido. É uma decisão pessoal. Não há garantias, apesar de insistir o crente que há.
No caso das religiões ditas reveladas é mais difícil aceitar os argumentos da não-existência de Deus porque o crente sustenta que o próprio Deus se revelou e que há um livro sagrado que é testemunho disso. Essa é a fé que ele professa. Histórica também. Mas será assim tão difícil continuar crendo, mas respeitando os que não crêem? Por que essa tentação em estabelecer uma ditadura da fé?
No mundo contemporâneo há espaço para todos e todas as razões são ouvidas. O que não podemos é sermos coniventes com a intolerância. Nunca devemos ser intolerantes a não ser com a intolerância. Nós seres humanos somos uma espécie que é definida pela sua racionalidade (Homo sapiens) e não pela opção de fé. Enfim, respeito é bom e todos gostam. Seria tão bom que crentes respeitassem ateus e ateus respeitassem crentes. Porque, no fundo, todos têm teto de vidro. Somos todos mortais e finitos demais para perdermos tanto tempo em condenar os outros.

 

Poema pra criança

POEMA DO PÉ

Eu sou o pé,
Meu nome é Zé Perequeté,
Meu trabalho é muito puxado,
Além de sustentar o corpo,
Carrego corpo leve e pesado.

Vida de pé é sofrida demais,
Gosto muito de descanso e de banho,
Quando não me lavam fico com chulé,
Quando eu me canso, preciso
de um aconchego que se chama escalda pé.

Tem gente que me trata bem,
Tem gente que se esquece de mim,
Ando descalço por aí e pego bicho-de-pé,
Quando sinto dor, gosto de massagem como cafuné.

Sinceramente, reclamo quando falam bicho-de-pé,
Pé não é lugar desse bicho parasita.
Sabe do que eu mais gosto? É de noite fria!
Quando me põem uma meia quentinha e bem macia.
Este é o poema do pé
que se chama Zé Perequeté.
Não é porque é o pé do Zé,

é o pé de qualquer um que gosta de cafuné e escalda pé.

domingo, 26 de outubro de 2014

Política e Religião

A RELIGIÃO E O PATROCÍNIO DOS SISTEMAS POLÍTICOS

Em todas as eleições nos deparamos com cidadãos que acreditam que determinado partido ou candidato está mais em conformidade com a vontade de Deus do que outros. Nessas eleições, evangélicos preferiram votar em Mariana ou Pastor Everaldo simplesmente por serem da mesma orientação religiosa.
Entre os católicos, os conservadores apostaram em Aécio por causa de sua imagem de pai de família, católico e devoto de Nossa Senhora. Os progressistas votaram em Dilma por causa dos programas sociais. A abertura para discutir o tema do aborto, por exemplo, trouxe muita rejeição para Dilma. A orientação religiosa tem muito peso na hora de votar, independentemente da qualidade do plano de governo.
A questão que levantamos neste artigo é que uma religião patrocinar algum partido ou candidato e incentivar seus seguidores a votar nele é muito arriscado. Se considerarmos os valores cristãos, podemos até dar um palpite sobre qual plano de governo se aproxima mais desse ideal. Mas ainda será uma solução muito arbitrária porque movimentos e grupos cristãos diferentes consideram questões diferentes como prioridade de um governo de orientação cristã.
Outro aspecto que se deve analisar é o desvirtuamento dos planos de governo. Se uma Igreja ou autoridade religiosa aposta todas as fichas no candidato X, exaltando seu plano de governo, e se esse candidato se corrompe, a autoridade religiosa perde muita credibilidade.
Portanto, na democracia nem religião, nem mídia devem patrocinar ideologicamente partidos. O papel da mídia é informar. Se quer se engajar politicamente que cumpra seu papel. O objetivo da religião é orientar moralmente, então, faça isso. Cada instituição deve cumprir o seu papel. Já o engajamento político partidário é função específica dos partidos. É este o princípio da nossa democracia.
O alinhamento entre religião e ideologia política é uma direção muito perigosa. O nome de Deus ainda é uma senha que abre milhões de cérebros para a aceitação de uma ideologia. Temos testemunhos tristes na História. Quando a Igreja se aliou ao Império Romano a partir do século IV só vimos a desmoralização dos cristãos. Mais tarde, o mesmo se deu com os setores conservadores da Igreja que apoiaram as ditaduras na América Latina.
Se cada instituição se contiver em desempenhar o seu papel dentro da sociedade, a democracia ganhará muito com isso. Por outro lado, as ideias defendidas até agora não pretendem engessar a participação política dos cristãos. Aliás, defendemos o contrário, o cristão deve analisar, tomar posição e intervir nos rumos da política. Mas sem essa identificação radical entre Igreja e partido.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Teologia e questões polêmicas

A TEOLOGIA E A CONDIÇÃO DAS PESSOAS HOMOAFETIVAS

Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso” (Mt 6, 36)

  1. Introdução
Considerando o constante embate entre cristãos sobre se a homoafetividade é uma condição pecaminosa ou não, desenvolvi este artigo como contribuição ao debate. Primeiro, iremos levantar os textos bíblicos que falam sobre o assunto. Antes de tudo, é importante lembrar que a moral bíblica, é na verdade, um conjunto de orientações morais, desenvolvidas em tempos e lugares diferentes. Há uma lenta evolução, há ambiguidades, mudanças de opinião, há concordâncias. Acima de tudo, é um processo complexo que exige leitura e análise atentas. São culturas e épocas distintas das nossas. Não somos herdeiros diretos dos antigos judeus. A herança veio até nós através de vários séculos, mediada por gregos e romanos.

  1. A condenação da homoafetividade nos textos legislativos vétero-testamentários
Os textos vétero-testamentários classificam a prática homossexual como abominação. São textos produzidos dentro de um contexto patriarcal, poligâmico (às vezes), que via o sexo como prática exclusiva para a procriação. A distinção entre o 'macho' e a 'fêmea' está explícita no Gênesis e sua função procriadora como parte da vontade divina. É uma ideia-chave para entender a mentalidade condenatória dos homossexuais nesses textos.

Com varão não te deitarás, como se fosse mulher: é abominação” (Lv 18.22). “Quando também um homem se deitar com outro homem como com mulher, ambos fizeram abominação; certamente morrerão; o seu sangue é sobre eles” (Lv 20.13).

Os textos afirmaram claramente que os atos homossexuais são condenáveis. Mas se referem exclusivamente à prática masculina. É um cultura androcêntrica. Os pecados são direcionados quase exclusivamente aos homens. O homem não poderia ter relações com alguém que não pudesse procriar. A cultura dos hebreus naquela época entendia o sexo desse modo. Por isso mesmo, que as mulheres estéreis eram criticadas. O texto prevê pena de morte ao homoafetivo. Ainda não vimos os defensores desses textos cumprirem literalmente a Bíblia, porque não matam as pessoas homoafetivas que conhecem. Prova de que admitem que o contexto de hoje é diferente, temos outra compreensão sobre o direito das pessoas. Ou seja, a moral evolui ao longo do tempo.

  1. O posicionamento dos textos neo-testamentários
Em 1 Coríntios 6, 10 há uma condenação:Não erreis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os maldizentes, nem os roubadores herdarão o Reino de Deus”. No texto, aparecem duas palavras da língua grega para designar o comportamento em discussão malakos (efeminado) e arsenokoites (homossexual). A prática homossexual é considerada um vício e classificada na mesma categoria do furto, da avareza e da embriaguez. Está tudo misturado. A nossa compreensão hoje não é a mesma. Por exemplo, embriaguez, como um ato isolado, pode ser considerada um vício moral. Mas quem se entrega constantemente, hoje é considerado como um doente. Do mesmo modo, o ato homossexual era visto como algo isolado da personalidade e da constituição psíquica da pessoa. Não se tinha ideia que era algo mais complexo, independente de escolhas.
A Carta aos Romanos também condena a prática:

Trocaram a glória do Deus incorruptível por imagens do homem corruptível, de aves, quadrúpedes e répteis. Por isto Deus os entregou, segundo o desejo de seus corações, à impureza em que eles mesmos desonraram seus corpos..., suas mulheres mudaram as relações naturais por relações contra a natureza; igualmente os homens, deixando a relação natural com a mulher, arderam em desejo uns para com os outros, praticando torpezas homens com homens e recebendo em si mesmos a paga da sua aberração". (Rm 1, 23-27).

Neste texto, a heterossexualidade é considerada pelo autor como natural. As relações homoafetivas seriam relações antinaturais, isso porque, os autores compreendiam o sexo exclusivamente a partir das genitálias e com finalidade procriadora. A compreensão da sexualidade no século I a.C difere enormemente da era contemporânea. Nesse quesito, os textos bíblicos não estão aptos para legislar para os tempos modernos em termos de sexualidade.
Outros textos neo-testamentários. 1 Timóteo 1, 9-10 considera que a prática sodomita é contrária à sã doutrina. E por último, em Judas 1, 7, mostra uma referência indireta a Sodoma e é acompanhada de uma ameaça de fogo eterno.

  1. Ausência nos Evangelhos de um posicionamento de Jesus
Diferentemente das Cartas citadas anteriormente, os Evangelhos não se posicionam sobre a homoafetividade. Jesus se depara com várias pessoas condenadas pela Lei judaica como a mulher adúltera, como o publicano pecador, mas não se depara com um homossexual. Porém, conforme sua cultura Jesus entende o casamento entre um homem e uma mulher, ou seja, monogâmico e heterossexual, em Mateus 19, 3-12.
Quando Jesus inicia seu ministério ocorre uma série de encontro com pessoas marginalizadas, aos poucos ele vai incluindo essas pessoas na sociedade e combatendo o legalismo dos fariseus e dos mestres da Lei. A Torah proíbe várias práticas de natureza sexual e de outros temas que deixavam as pessoas praticantes desses atos à margem da sociedade. Na época de Jesus a obrigação de seguir a Torah para um judeu estava acima da vida e de qualquer bem-estar pessoal.
O pleno cumprimento da Torah proposto por Jesus (Mt 5, 17), apesar de ressaltar que não é uma abolição da Torah, mas, fica claro que o rabino Jesus dá uma nova interpretação à Torah. Em Mateus 5, há uma oposição constante entre o que foi dito (antigos) e o que Jesus diz (novos tempos). A série de mudanças culmina no apelo máximo à misericórdia: “Amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam” (Mt 5, 43-45). Se até aí ninguém não tinha entendido que a mensagem de Jesus era de acolhida e de misericórdia, não há mais dúvidas. Para discordar disso é só se colocando contra Jesus e querendo estar à frente dele. Ou seja, 'um cristianismo apesar de Jesus'.
Jesus toma a opção de incluir os marginalizados, se opondo ao legalismo das autoridades judaicas. Em muitas situações ele se opõe à interpretação tradicional da Lei: A purificação do templo (Jo 2, 13-22), a colheita das espigas (Mt 12, 1-8), a mulher adúltera (Jo 8, 1-11), acolhida dos samaritanos (Jo 4, 1-26).
Mas Jesus tem um discurso de condenação veemente, e sua perspectiva se centra justamente nos grandes pecados em torno da preservação da vida e do bem-estar da pessoa humana (Mt 25, 31-46). O texto do juízo final enfatiza a condenação sobre a negação de direitos fundamentais do ser humano como dar de comer, beber, vestir, hospedar e visitar o próximo em suas necessidades. Portanto, os pecados alistados como condenação máxima são relacionados a necessidades vitais do ser humano.
Em Mateus 10, 5-15, Jesus envia os discípulos a pregarem a proximidade do Reino e a libertarem pessoas e avisa que quem não receber essa mensagem de libertação será tratado com mais rigor do que Sodoma e Gomorra. Se Sodoma é o símbolo do pecado homossexual, Jesus não está muito apressado em condenar aquelas plessoas, antes de tudo, ele profere uma ameaça a quem não recebesse essa mensagem de libertação do ser humano. No versículo 15, ele diz: “Eu digo a verdade: No dia do juízo haverá mais tolerância para Sodoma e Gomorra do que para aquela cidade.”
Enfim, a Palavra de Deus é para incluir o máximo pela misericórdia e menos condenação. E por que as pessoas homoafetivas teriam de ser condenadas? Se Jesus afirma para não julgar (Mt 7, 1), e para sermos misericordiosos como Deus é (Lc 6, 36), por que temos de usar a Bíblia para condenar e não aprendemos a lição de misericórdia do mestre de Nazaré? Embora, lamentavelmente, muitos cristãos pensam que acolher é ser conivente com qualquer situação moral, isso porque ainda não entenderam a perspectiva de Jesus e se ele aparecesse hoje, esses cristãos lhe dariam uma lição de moral. São legalistas demais, isso, definitivamente é contra o Evangelho.

5. A relativização dos textos bíblicos em termos de moral

Em termos de moral não é possível harmonizar os textos bíblicos. Se alguém no século XXI, seguisse a moral bíblica (entendida como uma unidade) literalmente seria chamado de nazista. Ele teria de discriminar e matar ladrões, homossexuais, adúlteras. Se o princípio da moralidade for exclusivamente a literatura bíblica, teremos problemas. Pois, essa literatura omite sobre muitas práticas como pedofilia, uso de drogas ilícitas. Se alguém interpelar: “Então, se não proíbe isso, logo é permitido.” O cristão dirá: “Mas não é assim!”. Então, ele admite que não podemos levar o texto ao pé da letra, mas separa aquilo que condena para colocar sob a autoridade do texto que concorda com a sua mentalidade. No fim, predomina uma leitura seletiva dos textos. De certa predomina uma leitura seletiva mesmo, porém, ela não pode ser particularista.

6. A desautorização do teólogo que critica a interpretação literal

Um cristão fundamentalista ao ler um artigo como esse terá as seguintes reações: “Olha, quanto besteira”, “Ele não respeita Deus”, “Sabe de nada”. Isso é coerente com a visão que ele tem de mundo. Porque para ele a Bíblia é uma autoridade absoluta, imediata e pronta. Não é necessário conhecimento da cultura, história, geografia, línguas originais para entender a Bíblia. Basta ler que o Espírito Santo dá as respostas prontas. Ele sabe, mas ele ainda não admitiu e percebeu que milênios nos separam da época em que os textos foram escritos. Portanto, se eu não mergulhar na cultura, separar contextos, respeitar a diversidade de gêneros literários, terei apenas um livro de receitas prontas que se chocará com a mentalidade contemporânea. Sem cautela e muito estudo crítico, não se faz um uso sensato da Bíblia. A misercórdia deve ser, portanto, a chave de leitura das Escrituras, e não a condenação.

Considerações finais

A acolhida das pessoas homoafetivas tem sua base no espírito libertador dos Evangelhos. A moral judaica e dos autores das cartas escandalizados pelo modo de viver greco-romano condenam, mas a mensagem de Cristo harmoniza essas perspectivas e nos oferecem elementos humanizadores para acolher a todos sem qualquer distinção. Ou seja, os textos legislativos e de cunhos morais têm de ser interpretados levando em conta a cultura da época em que foram escritos.

REFERÊNCIAS

BÍBLIA ON LINE. Disponível em <https://www.bibliaonline.com.br/>. Acesso em 14.10.2014.

BÍBLIA EM GREGO. Disponível em <http://bibliaemgrego.blogspot.com.br/>. Acesso em 14. 10. 2014.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Esclarecimentos



POR QUE ME EXONEREI DO MEU CARGO EFETIVO DE PROFESSOR DA REDE ESTADUAL DE MINAS GERAIS


Quase um ano depois de ter me efetivado como professor de filosofia na rede estadual de educação de Minas Gerais, eu pedi exoneração no dia 13/05/2014. Muitos colegas e amigos ficaram se perguntando sobre a razão, então, exponho abaixo os motivos para essa decisão um tanto radical.
  •  A recepção da filosofia no Ensino Médio é negativa. Primeiramente, ela ocupa um espaço mínimo na grade curricular. Ainda é considerado um conhecimento marginal. O sistema público de ensino não dá as bases para a aprendizagem da filosofia: Ler e interpretar bem.
  •  A escola tornou-se um espaço de violência. A ausência da família na escola e a fragilidade da autoridade da instituição escolar estão transformando a relação professor/aluno em uma ficção didática. A aprendizagem move-se para o último plano e cabe ao professor, como principal missão, garantir a disciplina. Educação moral se aprende em casa.
  • As licenciaturas não preparam o professor para o cotidiano da sala de aula, o sistema educacional muito menos. Os novos professores que tomaram posse no último concurso de Minas Gerais jamais foram convocados para uma capacitação objetiva, específica. A burocracia e as cobranças são frequentes, mas o Estado pouco oferece para a motivação e formação do professor iniciante.
  • A desmotivação dos professores é contagiante. Em reuniões e em encontros particulares, só há reclamações sobre a profissão. Sim, ela está desprestigiada. Mas se desde os veteranos até os novatos isso acontece, a classe não atrairá novos profissionais. Na boca de muitos docentes, cada período de aula é uma batalha. Não me conformo que tenhamos de passar a vida toda encarando o trabalho assim!
  • O investimento do professor em material para as aulas é alto. Não há livros para todos os alunos, os equipamentos de multimídia da escola são insuficientes para tanta demanda, competindo com tanta tecnologia nas mãos dos adolescentes e o professor tendo de se virar com giz, xerox e eslaides. Se quisesse ter tudo em mãos o investimento teria de ser pessoal.
  • O salário é alvo de reclamação geral. Mas eu deixaria a questão financeira em segundo plano, se os alunos fossem gentis e humanos, se os pais participassem da vida da escola, se o sistema educacional tratasse o professor como parceiro e não como súdito. Como professor se tornou uma profissão de risco e de alto estresse não há razões para se conformar com o baixo salário.
           Por essas razões decidi investir em outra profissão. Não desisti definitivamente de ser professor, posso atuar, se a situação favorecer um bom desempenho da minha função de professor. O respeito e a dedicação que tenho pela filosofia me fizeram revoltar ao me deparar com tantos adolescentes indisciplinados e alheios à aula, à escola, ao professor.
           O fator decisivo foi o desrespeito ao professor, a falta de humanidade. Muitos deles se diziam cristãos e me acusavam de ser ateu. Simplesmente, porque não compreendiam a criticidade da filosofia. Eu nunca me declarei ateu. Além de uma imaturidade de tantos adolescentes que nem descobriram porque estão na escola e que estão nas salas de aulas perturbando quem quer aprender. Definitivamente, estamos educando para a liberdade sem responsabilidade. Insistir nesse trabalho seria incoerente da minha parte. Cursei bacharelado e licenciatura em filosofia porque considero esse conhecimento fundamental para a vida do homem. Não foi só um diploma!
           Indigna-me muito mais quando este problema da indisciplina, culpa da família, é transferido para o professor. Já fui advertido pelo mau comportamento de alunos como se eu fosse responsável pelos valores que eles carregam. Professor é diferente de pai. Concluo, se não há quem quer aprender, não há razões para ensinar. Sou grato aos colegas da escola onde trabalhei e aos alunos aplicados que me deram satisfação em ensinar, desejo-lhes boa sorte!

JOSÉ ARISTIDES DA SILVA GAMITO
Professor de Filosofia
joaristides@gmail.com

sábado, 19 de abril de 2014

Questões biográficas: A morte nossa

SE EU MORRESSE HOJE?

Acompanhando recentemente a comoção midiática em torno da morte do ator José Wilker e do escritor Gabriel García Marquez, fiquei pensando, quando qualquer um de nós, simples cidadãos, morrermos, que legado nós deixaremos? Então, passei a refletir sobre mim mesmo. O que fiz até hoje? Qual o meu legado?
No âmbito pessoal, posso dizer que nasci de uma família pobre e de valores cristãos. As minhas pequenas conquistas são grandes vitórias em relação às minhas origens.  Conquistei um diploma de Ensino Superior e um certificado de pós-graduação, um emprego estável, um casamento que me faz feliz, casa própria. São passos fundamentais para se viver bem.
Então, se eu morresse hoje já teria conquistado aquilo que é fundamental para a vida. Mas se eu tivesse mais um tempo? Publicaria meus livros, fundaria uma ONG para ajudar as pessoas a ressignificarem suas vidas dilaceradas por tragédias ou condições sociais precárias. Faria uma especialização stricto sensu e me dedicaria à filosofia. Eu não poderia deixar reservar um espaço para a minha paixão por línguas e design gráfico. As artes em geral me atraem, principalmente, o desenho.
Porém, a vida não acontece de forma linear. Para dar uns exemplos, Alexandre Magno e Jesus Cristo morreram aos 33 anos e tornaram-se conhecidos mundialmente pelos seus legados. Mas milhares morrem entre 80 e 90 anos e são conhecidos somente entre familiares e amigos. Vida longa é uma dádiva, mas o que se faz de bom no tempo, mesmo que seja pouco, é muito importante. O bom seria se tivéssemos uma vida longa e bem vivida.
A felicidade é um desafio e depende da significação da vida. Podemos manter o sentido da vida mesmo diante das maiores tragédias. São duras, mas a vida não é linear mesmo. Não há planos seguros, desejamos sempre mais e morreremos com nossos projetos inacabados. No final, se ao menos, praticarmos a compaixão, a justiça e o bem. Sempre me consola a filosofia quando falamos em morte, sempre penso que o problema não é a morte, ela nossa condição, o desafio é viver significativamente nossa condição de mortal!


José Aristides.

sábado, 8 de março de 2014

Literatura Tupi


A LÍNGUA CLÁSSICA BRASILEIRA


Há muitos cursos que se ocupam das línguas antigas européias como o latim e o grego. Porém, falta despertar em nosso meio o interesse pela língua tupi. Ela foi usada no Brasil colonial. Ela é a nossa língua clássica. Abaixo apresento um poema que compus na língua tupi:

ASEKARYNE

Amana okyr.
Marãpipó moranduba?
Xe remirekó nd’oúri,
Amana suí osykyîébo.
Emonã  resé,  xe remirekó
Asekaryne.

Ko’yr mamõpe ereîkó?
Na abá ruã xe momorandub
 xe kunhã resé.
Agûatá  Irasema roka koty,
Xe remirekó oker oupa!
Ko’yr xe roryb!

PROCURAREI

A chuva cai.
Quais as novidades?
Minha mulher não veio
Temendo a chuva.
Por isso, procurarei
Minha mulher.

Onde está você agora?
Ninguém dá notícias dela.
Caminho até a casa de Iracema.
Minha mulher dorme!
Agora estou contente!

Revisão: Emerson da Silveira Costa (tupinista, Belém - PA).

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Tupi antigo e línguas indígenas modernas


ESTUDOS COMPARATIVOS DE LÍNGUAS TUPI-GUARANIS

 

COMPARAÇÃO LÉXICA ENTRE GUAJAJARA (TENETEHARA) E TUPI ANTIGO

 

VOCÁBULO
GUAJAJARA
TUPI ANTIGO
Andar
watá
gûatá
Anzol
piná
pindá
Banana
pakó
pakoba
Batata
zutikaí
îutyka
Bonito
porang
poranga
Borboleta
panâmo
panama
Cachorro
zawára
îaguara
Céu
iwak
ybaka
Estrela
zahitatá
îasytatá
Feio
naiporang
nda i porang
Fogo
tatá
tatá
Galo
zapukái-awá
gûyrasapukaîa
Homem
awá
abá
Lua
zahi
îasy
Mamar
kamu
kambu
Mulher
kuzãtái
kunhãtai
Nós
zané
îandé
Pedra
itá
itá
Peixe
pirá
pirá
Sal
zukira
îukyra
Sol
kwarahy
kûarasy
Tábua
wirapéw
ybyrapeba
Terra
y’wy
yby
Vento
iwitú
ybytu
Vermelho
pirangahí
piranga

 

NOTAS: Algumas correspondências fonéticas. O b da língua tupi é w em guajajara. O î se tornou z. O h do guajajara é s no tupi.